Tô em outra. Enquanto decorre a aula de Merdodologia, eu penso no fogão que eu deixei aceso lá em casa, o gás do forno ligado com o meu gato lá dentro. Cachorro miava demais hoje à tarde, tirou-me a paciência. O nome dele é Cachorro. O meu gato, que a essa altura da aula deve estar assado.
Elegi ‘O Idiota’ pra ler durante todo o curso de Merdodologia. Posiciono o livro por trás do Fulano que se senta na minha frente e pronto, mais uma hora e meia de leitura por terça-feira. Dostoievski me entende e apóia o bom proveito desse tempo gasto na minha vida. Ele bem sabe o que é relevante de se pensar. Estou inclusive cogitando indicar ‘Notas do Subsolo’ à professora de Merdodologia. Vou descobrir o dia do aniversário dela e dar-lhe a obra. Farei a seguinte dedicatória em letra de fôrma: “Para a querida professora de Merdodologia, uma excelente fonte de leitura para as noites tediosas e solitárias das sextas-feiras.” Ela há de me agradecer. Ou se jogar do apartamento. E a causa da morte será: homicídio doloso antecedido de pressão psicológica da vítima contra as suas verdades mais íntimas. Ela e meu gato Cachorro, ambos mortos graças à minha habilidade em esfregar verdades na cara do mundo. Pelo fim de Cachorro eu não pagarei, basta enterrá-lo no jardim – servirá de adubo. Quanto à senhora professora de Merdodologia, escaparei com o argumento de honestidade perene. E hei de ser louvado um dia.