De: thiago barbalho (thiagobarbalho@hotmail.com)
Enviada: quinta-feira, 4 de janeiro de 2007 1:43:14
Para: thiagobarbalho@hotmail.com
você queria o mar, mas eu me banho é na neblina da fumaça ao redor. Você queria andar, mas eu me divertia entre os corpos e os ratos adormecidos no metrô. tenho a impressão de que, se minha rotina fosse aí, minha mão não pararia de agir: nos dias de folga muitas palavras em papel, nas horas ocas muitos blocos de anotações. a correria daí me inspira, eu aspiro poluição e fertilizo meu poder criativo. Os andarilhos esmos, os apressados hippies, os enlaçados executivos, as lisas putas, os grupos seissentistas. Eles empurram minha cabeça contra a parede opaca de uma folha, porque de algum modo é no traço que eu fotografo, é na tessitura do idioma que eu os traduzo, é na cor constante da caneta que eu os revelo em todo o tom. de um jeito tonto essa cidade aí me magnifica - sou premiado e brindo ao céu nublado. é das poucas vezes que me vem à mente [normalmente pessimista] a conclusão de que
I. Agradeço por viver,
II. Estar vivo é dadivoso,
III. Apenas isto é suficiente, porque daí as pernas se movem em busca do deslumbramento.
Porque já pensou morrer sem viver viagens.
Olha o mundo. Quero devorá-lo qual um docinho. o mundo negro que nem um brigadeiro - ou um doce de feijão, se preferires. engulo o mundo de todos os lados, várias vezes e aos poucos, que é pra guardar um pouco do gosto pra mais tarde, e em inúmeros instantes saborear o açúcar de cada canto, o apurado aroma de todo lugar. guardar pra mim o que é de todos: as ruas e a chuva vindas de surpresa. Guardar o segredo dos pedintes e dos camelôs ritmados pela ronda dos Homens Armados. Passar pelas pedras, respeitar os pombos domesticados. dormir na porta das Casas Bahia e acordar no meio-fio. Rebelar-se contra as travessas, entender que os semáforos dão cor e vida ao azedume do asfalto. afastar-se das sombras dos prédios, eles perigam cair. o sol por trás deles projeta o desabamento de cada dia dado hoje.
Haja jornal aos anunciantes, haja sinuca e pebolim aos insones de uma noite prorrogada. talvez eu quisesse a rotina paulistana pra ver se eu abusava; ou mais ainda me detinha nos detalhes - nas molduras dos quadros expostos em museu, nos espelhos do museu, no guarda do museu (pastorador de obras-primas). Não sei o que me dá, mas dá para notar que ali na parede sem cor nem nome há uma entrada - Digitar a senha no canto do muro e se enfiar na passagem-secreta que se abre às 5 da manhã. Dedos ágeis e cabelos voláteis na pista de dança. Seios dados e paus dardos no avançar das horas. E mais dança e mais dia. E mais lábios em agonia. Ah que o dia é de todos, e o meu trabalho é viver.
sábado, 6 de março de 2010
você queria o mar, mas eu
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