sábado, 18 de abril de 2009

Close nos olhos dela, assim mesmo. Enquanto vê o tango nos passos da milonga e ouve o arrastar dos sapatos das senhoras, jovens senhoras já encaixadas em outras pernas de linho, marcadas de virilidade. Parar-se dois minutos e meio nos olhos dela, deixar o tango tocar, trazer o som dos sapatos no chão para o primeiro plano auditivo. Azul ao redor e preto reforçado nas sombras. Vermelhas as veias dos olhos. Não quero saber de medo de lugar comum, vou fazer assim, o filme é meu. Os olhos de quem espera ser chamada. Os olhos de quem vê olhos alheios do outro lado do salão. Serei eu eleita hoje? - gosta de tango com homens casados, vai à milonga para se realizar. Os olhos molhados de noite. As pernas erguidas à espera da dança. E pergunta-se: o que ali se realiza, que desejo se mata no passo ritmado pela voz dos instrumentos. A própria música, um que sem quê, ela pensa. Que dizer da própria dança, coisa incorpórea conduzida através da quebra onírica das melodias. Fenômeno que ela não toca, mas que a carne de seu corpo reage em incontestável realização. Como o olhar mesmo, o olhar dela em foco, que lhe faz ver aquilo que nem toca no seu olho. A música e a dança são como o olho que vê aquilo que nele não chega a encostar. Tudo sem consistência física, mas ainda assim indubitável e tocante. Tudo isso nos dois minutos e meio de close nos olhos dela. O filme é meu. Aceitar o não-entendimento do que faço nunca foi um problema meu.